domingo, 7 de dezembro de 2014

À noite...

À noite nos transportes tudo é diferente… Vemos o metro mais vazio, o que nos permite contrastar as cores das carruagens. Vemos as pessoas mais apagadas, o que nos permite pensar que o dia foi estafante. Vemos a lua pela janela dos autocarros e imaginamos…
Imaginamos a vida bela, as utopias, o futuro. Aquelas condições de êxito que não nos não dão êxito porque não o são, mas que nos transportam para outro mundo. O mundo onde toda a gente é feliz, contente e onde existe justiça. À noite, a nossa imaginação vibra com os momentos de silêncio…
À noite o silêncio transforma-se em música, permitindo que grafemos, que desabafemos que nos libertemos. À noite a música, ela própria, leva-nos para outro patamar. Eleva-nos para o telos humano, o telos cristão, o telos da vida.
O patamar… O patamar das óperas onde a espinha nos arrepia por tão bela melodia soar; o patamar dos concertos onde a nossa mão fica no ar perentoriamente… tudo isto à noite faz parte do patamar da vida.
E a vida? À Noite, pode ser vivida sozinha?
À noite a solidão custa, as borboletas na barriga moem e o choro regressa. À noite não há uma grande forma de consolo. À noite, numa primeira fase somos nós e nós e numa segunda somos nós e eles. Quando deixamos de ser crianças o nós e nós passa a nós e eles, porque, eminentemente, perentoriamente perdemos a ignorância, ganhando mais e mais saber.
O nós e eles, à noite, em qualquer lugar, é tão diferente do nós e nós, o que nos permite crescer, inovar, ir à ópera ou a concertos e elevarmo-nos a outro patamar.
Mas… Mas eu não gosto da noite. A noite é escura e à noite não há movimento, stress, sol, luz!
À noite que posso eu fazer? Caminhar para casa, ouvindo o arrasto dos pés de cada vez mais pessoas que estão cansadas e adormecem nos transportes? Fechar os olhos e utopiar, sonorizar o impossível? Grafar? Eu sou um animal da manhã, assim cresci, assim me fiz. Porém, admito que tenho medo… parece que nada vive sem a noite e penso que perderei tudo se nada fizer. Porquê?

É neste pensamento do porquê que me vêm lágrimas aos olhos, porque mais uma vez, por mais condições de êxito que eu tenha, não o alcanço porque não o tenho (o êxito). Quero gritar e pensar no que posso fazer, na companhia do nós somente. Não no nós e nós da infância e do nós e eles do resto da vida. No nós, no nós complexo e retorcido como à noite se veem nos nós dos barcos atracados nos pontões, à espera que, na manhã seguinte o motor volte a ser ligado e que eles naveguem até ao quase infinito!

Sem comentários:

Enviar um comentário