Pairava já há uns dia sobre o meu novo espaço de trabalho. Tinha acabado de aceitar uma nova oferta de trabalho. Além de ser Presidente da Câmara Municipal da minha cidade, ainda era responsável pela gestão de um Centro Hospitalar.
Tempo para mim não havia. As refeições ou eram tomadas no hospital ou na Câmara Municipal. E fazia sempre o trajeto de autocarro, tanto de casa para um dos trabalhos, como entre eles. Não tinha a mínima vontade de andar a poluir o meio ambiente que tanto tinha ouvido na escola para preservar. Sempre que me lembro disso vem-me à memória todos os professores de Ciências, a falar da preservação dos ecossistemas ou do aquecimento global - de facto é algo que o homem não considerou quando começou a revolucionar a indústria e que é drasticamente importante, mas... é abusiva a forma de tratamento nos diversos anos de ensino.
Lembro-me da rotina daquela quarta-feira. Todinha... Como de costume, levantei-me às 7h13 para higienizar-me e antes das 7h30 estar a tomar o pequeno-almoço, para até às 7h47 estar na paragem a fim de apanhar o autocarro que me levava ao hospital onde eu fazia questão de entrar até às 8h15 todos os dias. Após o trabalho naquele enorme complexo de saúde e dado que na véspera tinha tido uma alteração de rotineira devido a uma reunião na Câmara de manhã, dizem-me para ir à Igreja do centro da cidade. Espantado com o que me tinham dito, anui ao pedido e aventurei-me pelos transportes até ao centro. E quando lá cheguei as lágrimas começaram-me a cair. A pessoa com quem eu barafustava quando era adolescente, bem como fartava-me de dar conselhos estava ali, dentro do caixão castanho que contrastava com a branquidão das paredes. Eu ao entrar, com uma calmaria não habitual, fiz ranger a porta de madeira que ali se opunha à minha entrada.
Era tão nova a última vez que a tinha visto. Tinha-se acabado de graduar. E agora está ali à minha frente inanimada, com o coração parado, com as ideias em standby definitivo. Peguei em mim e nas minhas forças e saí daquele espaço. Não a conseguia ver morta. Nunca! Ela não merecia aquilo, ainda por cima tão nova ainda. Atrevi-me a perguntar ao rapaz que estava a fumar à porta o que se tinha passado, até que percebo que ele também tinha sido meu colega de escola. Tínhamos andado os três no secundários juntos e ele era o marido dela. As únicas palavras que o meu ex-colega me disse foi acidente de carro. Cá, fora, longe da presença dela derramo as minhas lágrimas a torto e a direito. Depois disso, mas ainda com a tristeza presente na face reentro na igreja e aperto pela última vez a mão esquerda dela. Já estava fria. E ela sempre era quente, alegre e bem disposta.
Não aguentei de novo. Saí de lá e cheguei à Câmara. Encharquei-me em comprimidos para me dar sono e deixei-me dormir na minha secretária. Aquele dia já me tinha dado demasiadas emoções. Vê-la ali, e ao marido a fumar à porta foi demais para mim.
Não conseguia olhar, retrai-me depois quando acordei e deixei-m escorregar pela porta do gabinete a baixo. O que eu perdi!, exclamei. Fechando também os olhos de seguida, para tentar esquecer o que se tinha passado naquele dia, a minha cara conseguiu voltar ao que era, mas a dor, cá dentro permaneceu a mesma desde aquele minúsculo dia que demorou imenso a passar. Já era noite...