segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Contrastes.... e Felicidade

A sala estava repleta de gente. Todos atrás de mim. Centenas ou muito mais e eu ali, na primeira fila, a substituir o reitor da Universidade. Os meus superiores tinham ficado doentes e eu era o único do Conselho Pedagógico que não tinha ido ao jantar do Encerramento do Ano de Trabalho num restaurante chique lá para os lados de Belém, além de todos os membros da Direcção. Tinha sido tudo em cima do tempo. Não se conseguia desmarcar nada. E alguém tinha de substituir tal importante pessoa.

Corriam na sala os zuns-zuns de quem seria o substituto do reitor naquela importante homenagem de fim de curso. Mas nenhum estava certo. A cerimónia começa. O professor responsável pelo curso de Medicina começa o seu discurso salientando a importância deste curso para a vida no século XXI e congratulando todos os aqui estavam sentados que tinham acabado o curso, visto que foram anos árduos de trabalho e de dedicação. Ao fim do seu discurso, ouve-se na sala um grande burburinho.

Estava na hora de eu subir ao palco. No entanto, ninguém sabia quem é que iria substituir tal pessoa bastante importante ali. Era simplesmente eu, um jovem que ninguém sabia quem era, que nunca se tinha cruzado com nenhum estudante de Medicina nos corredores de tal faculdade, mas que todos os anos era eleito pela Lista D como representante dos estudantes no Conselho Pedagógico e além disso, em dois deles na Reitoria como Representante do Pessoal Discente.

Ali estava, perante mais de quinhentas pessoas, um rapaz de poucos anos, barba feita, cabelo cortado à pouco tempo, finalista também que iria entregar o prémio a tantos semi-homólogos. Abri convenientemente os olhos e, tentando colocar a voz, comecei:

"Boa noite caríssimos membros da Reitoria da Universidade, membros dos demais departamentos, Exma. Sr.ª Ministra da Saúde, Exmo. Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior, Caros Alunos, respectivas famílias, é com muito gosto que estou presente nesta cerimónia de entrega de medalhas e diplomas aos nossos futuros anjos brancos. A medicina tem sido sempre um curso de excelência no nosso país. Como todos, tem as suas maleitas, mas nunca se deixou cair como muitos outros cursos. Mais de metade dos alunos inscritos terminam o curso em seis anos. Os restantes em pouco mais. Isto são marcas de excelência no posso pequeno-grande país.

Este ano é especial. Apesar de ser Junho como em todas as entregas, e ter decorrido um ano sem grandes desafinidades culturais e sociais nesta faculdades, este ano marca a entrada de bastantes mais jovens no mundo do trabalho português, através de bolsas, novas vagas em hospitais e ainda possibilidade de sair do país e trabalhar num outro país do mundo à escolha do aluno.(...)"

E eu estava ali, a declamar palavra após palavra perante tais pessoas. Uns médicos com os filhos acabados de formar, outros a chorar porque era a primeira geração da família que era da área médica. Olhava eu para todos os lados, via olhos atentos, caminhos fechados, seguranças por todo o lado e em todo o redor. Por mais que eu quisesse estar calmo não podia. E continuei...

"(...) Além do mais, temos de saber dizer que foi neste ano que foi concluída a transição para o Processo de Bolonha. E não fazendo esperar mais tempo, aqui vai a lista de finalistas:

Adriana Filipa Morgado
Ana Josefa Marques
Ana Maria Ribeiro
(...)
André Sousa Silva
Anamisa Pereira Costa
(...)
Eduardo Mia Nobre
Filipe José Pedro
(...)
Maria Ana Morgado
Maria Beatriz Zorro
Maria Clara Fragoso
Maria do Carmos Feliz
Maria Daniela Sousa
(...)
Tiago Miguel Vaz
Zélia Tomate Saudade

Agradeço que os nomes mencionados subam ao palco e que sorriam para que fique marcado nos registos desta brilhante faculdade, o conjunto de pessoas que terminou o curso neste ano lectivo, através de uma fotografia.

Muito obrigado. Boa sorte para todos."

E assim saí do palanque. E eles, os meus colegas ali ficaram para a fotografia. Deixei o meu lugar e saí. Fechei os olhos e segui pela fila central até à porta. Quando cheguei junto desta fiz adeus. E saí. Fechei a porta sem fazer barulho e depois de vestir a batina sigo para o metro com uma vontade enorme de chegar a casa. E assim foi. Quando cá cheguei, reparei que não fazia mais sentido ter o meu antigo telemóvel desligado, ignorar todos os meus ex-colegas, nem nada disso. Foram seis anos assim. E tudo culminou com uma apresentação pública. E quando o liguei revivi tudo. As preocupações, as saudades, o desejo, o prazer, o choro e o sorriso. No fundo, senti um grande aconchego. Mas continuei. Deitei-me naquela noite e na manhã seguinte, ninguém se tinha lembrado que tinha sido eu a substituir o reitor.

Tinha voltado ao meu trabalho de estagiário, enquanto estava a apertar a bata para entrar no laboratório me cruzo com alguém cheio de livros de Anatomia no ombro. Eu distraído e tal pessoa a ler, poin... Um contra o outro. Apanhei-lhe os livros, sorri e continuei o meu caminho até ao laboratório e sem querer não vi quem era o meu colega ou a minha colega de que ali vinha. O que era esquisito era o facto de que aquela zona era apenas para o meu curso. E não se dava anatomia nem no quinto nem no sexto ano. Era estranho... Mas deu-me vontade para continuar com a pesquisa que estava a fazer. E assim se passou mais um dia...

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Autocarros, escrita e dinheiro....

Levantava-me, ia para a escola, almoçava, vinha da escola, arreava a mala em casa e ia ver autocarros.

Saía de casa depois de comer uma ou duas bolachas, com um papel na mão com uma base rija para que pudesse escrever: o número do autocarro, o serviço, o horário e a carreira. Fazia isto todos os dias úteis. Estivesse chuva ou fizesse Sol, independentemente da estação do ano, estava ali sentado, naquele banco branco, por baixo das árvores, horas infindáveis.

Sem telemóvel, computador ou qualquer outro aparelho tecnológico. Apenas o meu corpo, a minha roupa, os meus sapatos, a minha caneta e o papel com a base rija.

As pessoas passavam apressadas para chegar a casa e eu ali, debaixo daquela árvore que transmite alergias na Primavera e no Outono, e que me cobre o Sol no Verão e não deixa aquecer nada no Inverno.

Tempo e tempo e tempo e tempo. Escrita atrás de escrita atrás de escrita.

Uma vez uma pessoa parou. Tentou perguntar-me as horas e eu respondi. No dia seguinte, um jovem perguntou-me as horas e eu respondi. No terceiro dia uma senhora de idade perguntou-me as horas e eu respondi. Chegámos ao quarto dia, quinta-feira, e um outro rapaz vem-me perguntar as horas e eu expulso-o das minhas proximidades. Longe de mim, parecia uma ave a fugir da boca de um leão.

E continuei naquele dia até à noitinha, a contar autocarros, a ver veículos, a dizer horas. Na outra semana, deixaram moedinhas. No primeiro dia contei um euro, no segundo dois euros e no terceiro cinco euros. Mas eu não queria dinheiro. Guardei aquela quantia que me tinham dado e meti-me no autocarro e fui ao Terminal. Aí passei uma tarde.... Calado como sempre, com um papel com uma base rija por baixo a anotar tudo. Mas nada, nada mais do que a minha roupa, sapatos, caneta e papel.

Apesar de tudo, e da proximidade do mar, um dia saltei para lá para salvar uma pessoa que tinha caído, porque tinha estacionado mal o carro. Depois disso, meti-me em casa e nunca mais saí. Fiquei lá o resto dos dias. E os autocarros puff. Foram-se....

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

News....

Seja dita a verdade, de facto, numa ténue manhã de Outono acordei sem mais nenhuma vontade de escrever.

O que está escrito e publicado não me arrependo de o ter feito. O que são ainda ideias e que poderiam fazer parte de frases de um post, possivelmente ficam cá dentro até voltar a ter vontade de escrever. Ou histórias longas, ou pensamentos futuros, ou memórias, ou desabafos, ou sonhos.

No fundo, não sei porquê, ou melhor acho que sei, mas não seria justo revelar tal razão, sentir-me-ia despedido a nível pessoal.

E cá estou, continuando a vida de aluno do Ensino Secundário, com um blog minimamente activo, à espera que a vontade volte e que eu não tenha medos de escrever nada. As palavras fortes são duras de entender. As mais frágeis e simples de ouvir são as que mais marcam. Isto é, um simples sinal de cara dá para perder a vontade, enquanto que uma palavra proferida faz pensar e, se calhar, um texto escrever.

Por isso... Até ao próximo texto. As ideias estão cá, mas o medo sobrepõe a elas! Infeliz estou, mas tenho de me respeitar e respeitar os leitores deste sítio....

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Da minha janela eu vejo #4...

(Hoje a minha janela são os meus olhos...)

Vejo a minha melhor amiga a ser levada por um palhaço para um casebre longe de onde vivemos, dentro de um carro preto. Nada podia fazer, pois poderia estar a colocar a vida dela em risco.

Duas horas mais tarde, apareço no casebre mascarado de carteiro. Aí, quase que mecanicamente me aprisionaram-me. A sala estava vazia, apesar de estar lá palha, ela, eu, uma televisão e o palhaço com as respectivas cadeiras.

Sou forçado a sentar-me numa cadeira antiga, enquanto que o palhaço me amarra e está de cabeça baixa. Durante esse tempo, faço sinais com a cabeça para que a minha amiga saia daquele casebre com a cadeira às costas, fazendo ainda sinal que atrás de uma pedra, onde ela podia partir a cadeira, estava uma nota de dez euros, para que ela pudesse apanhar o autocarro.

Ali poucos autocarros passavam, um de manhã e um à noite. Eu queria que ela fugisse dali. Ainda com medo, de já com a cadeira partida, o palhaço dá pela falta dela e o autocarro já se avizinhava. Ela corre que nem uma louca pela encosta abaixo, apanhando ainda o dito transporte.

E eu ali sentado junto ao palhaço, depois de ele ter regressado. Ele não se importava se fosse eu ou ela que estivéssemos reféns, porque apenas era um desejo dele fazer alguém refém. Apesar disso, ele sabia que nós éramos amigos.

Passaram-se anos e soube pela velhinha televisão que ela se tinha tornado esposa do chefe de governo.

Do nada o palhaço mata-se. E eu continuo ali, agora sozinho a ver um corpo em decomposição.

Ainda preso, mas já maluco da cabeça, consigo pegar num objecto cortante e atirá-lo ao ar. Mas nunca tive jeito para o voleibol, daí a faca se ter espetado junto ao coração. Eu comecei a ver o meu sangue a correr pelos meus braços e a coalhar no chão, e ainda uma faca no meu coração.

Duas mortes em pouco tempo. Porque é que ela não me veio salvar? Eu vim salvá-la, porque não queria que ela sofresse.

Mas não entendo porque é que ela não veio ter comigo. E agora estou morto. Não vivo. E ela, feliz, não sabendo que estou morto.

Quem me dera ser quem não sou...

Sou diferente dos outros de manhã à noite. Mas quem me dera não ser. Poderia parecer-me a um adolescente normal, onde a escola é para aulas e namorar apenas, a família é para dar dinheiro e os amigos são para sair. No fundo, nada disso sou eu. Choro muito baba e ranho, quando me desvio da estabilidade que é minha.

Em vez de acordar à hora normal, há três noites que as quatro da manhã são o meu despertador e fico assim, até às seis sem fazer nada a pensar no meu dia.

Assim é, os meus olhos choram, o meu nariz entope, e lá já vão três dias.

Em vez da escola ser apenas um espaço de aulas e namoro, para mim é o espaço da calmaria e do consolo. Tenho saudades dela muitas vezes. Lá, posso chorar, gritar e escrever tudo. O gosto pela família não me permite tirar-lhe (pedindo) dinheiro a toda a hora e os amigos são para ouvir (ajudando-os) e para sair.

Em vez de saber jogar futebol, sei ouvir as pessoas; em vez de andar com os rapazes sei ver e lidar com as raparigas; em vez de jogar jogos violentos, adoro transportes.

Quem me dera não ser assim. Ser mais um como todos os outros. Se calhar pareceria melhor.

Ups... Já ouvi o som do primeiro comboio na estação. O dia já começa. Não o posso fazer parar. Só peço para não chorar muito hoje. De resto nada posso mexer. Apenas tentar ser eu.

Vivo todos os dias amedrontado. E quando vou ao pé do rio muitas vezes, é mau sinal.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Da minha janela eu vejo #3...

Uma estação de comboios.

Uma estação de comboios, mas em tudo diferente das outras, onde os comboios chegam com muita frequência e partem de longe e longe. Esta estação já tem uns anos, mas lembro-me da sua construção, já cá estava. Vi ser posto pedra após pedra, ligarem os cabos eléctricos e também a vi ser inaugurada.

Agora, passado esses anos, apenas vejo poucas pessoas na estação, mas a mesma continua a ser rentável para a empresa que a explora, porque os lucros não são os bilhetes, mas sim a emoção. Consoante o humor da pessoa, assim é dado o valor que é debitado na conta da empresa responsável pela estação.

E eu ali, em frente a ela. Raramente ponho lá os pés, prefiro caminhar mais um pouco e utilizar o autocarro, para efectuar o mesmo percurso. Mas hoje, algo me levou a estar mais de uma hora junto à minha janela a ver os comboios. Não porque gostasse deles tanto como gostava dos outros, mas porque algo se estava ali a passar.

Vi alguém ali, na plataforma, sentado no banco, sem bilhete, com uma máscara posta. Via-se ao longe que era uma máscara, de fraca qualidade, mas que era tal e qual a cara do rapaz que ali estava.

Por trás daquele sorriso mascarado, via-se bastante bem também a expressão negativista daquela pessoa. Estive imediatamente para descer e ver o que se passava ali, mas não tive coragem. Fiz outra coisa: liguei para a bilheteira. Tinha conseguido o número, porque numa das vezes que existiu uma greve dos autocarros, pedi o número ao revisor. Vinha eu da escola.

Liguei como disse e perguntei quando é que tinha sido a última vez que o comboio tinha partido. O funcionário não me deu nenhuma resposta com sentido. Apenas um "há pouco tempo".

A noite chegou e eu deixei de poder olhar para a estação. Fiquei com a expectativa de aquele rapaz ter seguido a sua vida.

Na manhã seguinte vou, espreguiçar-me, como de costume à janela, e vejo ainda lá o rapaz. A tremer, a chorar, sem nada por cima e um dos comboios já aí vinham. Mas desde aquela última partida que aquela plataforma não era usada. Ou seja, as pessoas, saiam pelo outro lado, nunca viam o pobre e triste rapaz ali. Já não podia fazer mais nada senão ajudá-lo. Desci as escada do meu prédio a correr e fui, com um cobertor meu à estação. Ele ainda estava com a máscara posta. E trouxe-o. Ele mal subia as escadas do meu prédio. Quando consegui chegar com ele à cozinha, e lhe tirei aquele objecto tão falso, tentei animá-lo com um chá quente, e uma torrada.

Ele continuou calado, mas comeu tudo. E eu estava sem fome. Pareceu que houve transmissão de sentimentos. Depois de ele comer, e já com um aquecedor ligado para que os pés gelados pudessem aquecer, pergunto-lhe o porquê de ele ali estar há dois dias, naquela plataforma de partidas e poucas chegadas. O pobre rapaz respondeu utilizando os braços, simulando um aconchego e de seguida voltou-se para a parede da minha cozinha e direccionou o dedo indicador esquerdo para a estação dos barcos. E eu anotei.

Já se tinha passado mais de 30 minutos e eu ali com ele, na tentativa de ouvir um nome, uma morada, algo que me pudesse levá-lo a casa, ou a alguém que o conhecesse melhor que eu, e de certa forma o pudesse ajudar. Ele levantou-se, após eu dizer que ia o que queria levar ao hospital. Queria fugir, mas eu tentei tranquilizá-lo. Quase de arrasto me levou da estação dos barcos à estação dos comboios e daí a uma rua longe dali. Já eu cansado de andar e ele, já cambaleava e apontou para um prédio. Toquei à campainha e veio uma senhora de meia-idade. Questionei tal senhora acerca do rapaz e a mesma disse que o conhecia há algum tempo. Eu pedi, com muitas desculpas, se ele lá podia ficar. A senhor aceitou. E ele, subiu as escadas mais uma vez.

Lembro-me de no fim das escadas ele me ter feito adeus, e, ainda, me ter vindo ver à janela. A partir daí, não soube mais nada, mas via e continuo a ver, naquele lugar um rapaz, com aquela máscara, à espera que um comboio chegue naquela plataforma de partidas. Um comboio para ele...

Ele está lá, mas já tem uma mantinha, apesar de continuar à espera.

sábado, 6 de novembro de 2010

Uma reflexão...

... do passado, para o presente e para o futuro.

Lembro-me como se fosse hoje. Era um fim-de-semana, à noite. Vinte e três e qualquer coisa. Ambos estávamos fora da hora normal para nos irmos deitar. Ainda me recordo que pouco faltava para a meia-noite. E eu estava com medo. Não a conhecia. Não sabia como dizer nada, acerca de assuntos mais sérios, com menos brincadeira. De repente veio-me uma vontade louca à cabeça e disse-lhe que a amava. Mal a conhecia e disse-lhe isso. Parecia um puto de dez anos a dizer a uma amiga que gostava dela. Aquilo foi sentido. Não foi "epah, acho que gosto de ti...", foi mesmo algo importante que saiu (apesar de ter sido com algum medo) após pensar e repensar, ler e reler conversas, olhar e reolhar para mim. Mas continuava a não conhecê-la. Depois de ouvir a resposta dela, pergunto-lhe com sinceridade se devia esquecer, e ela responde que deveria fazê-lo se conseguisse.

Aí começou o retrocesso. O aprender a controlar-me e saber que apenas poderíamos ser amigos, independentemente do que eu achasse dela, ou que soubesse, ou que pensasse, ou que me dissessem ou que nós fizéssemos. Foi complicado. Sim, foi bastante complicado. Um amigo meu, meses depois, voltou-se para mim e disse-me que tinha sentido tudo aquilo porque se nós assemelhassemos o acto de início de uma relação mais séria à vitória de uma batalha, esta poderia ter sido uma batalha quase ganha. Depois de ouvir o que ele me disse, disse que não podia ser e que não acreditava naquilo que ele dizia. E continuo a não acreditar. Apesar de ele mo ter dito.

O tempo passa e admito que não sou de ferro. O processo de retrocesso também tem recaídas e eu assumi-as, nunca perguntando se ela estaria interessada, dizendo apenas o que se passava comigo mesmo. E os meses continuaram a passar...

Passaram até ao ponto de eu achar que já nada poderia influenciar as minhas recaídas, isto é, não voltaria a ter pico de gosto amoroso por tal rapariga. E de facto, se os tive recentemente, não dei por eles. Se calhar porque registei cá dentro a resposta daquela noite que foi calorosa, mas que me parecia definitiva. Não me lembro mesmo de recaídas recentes. O que sei é que por vezes, desejo as ter, quando não estou em mim, ficando arreado a uma parede branca do meu quarto ou na escola, num canto da "minha" sala quase que a chorar. Por outro lado, acho bem não ter tido nada, porque significa que sou forte o suficiente e que consolidei, com cimento forte, os sentimentos passados.

Mas tudo tem um mas... Mesmo que não queiramos algo adversativo, existe sempre um mas, em tudo. Pergunto agora, e se fosse agora. Se a tivesse conhecido nesta altura e começasse a sentir tudo como naquela altura? Ou ainda, depois de tudo, se sentisse muito mais do que senti naquela altura?  Ou mais ainda, se me viessem dizer que ela estava interessada em mim, como é que eu reagiria? Será que alteraria o meu comportamento ou ficaria como estou agora, respondendo-lhe de forma clara e objectiva o que está cá dentro.

Muitos dizem que o futuro é incerto, e eu também sou apologista disso. Mas, e o presente? Também não o é? Nós não sabemos o que traz cada comunicação, cada pensamento que nos chega naquele instante que não estávamos a pensar ter ou ler ou ver ou receber ou enviar.

No entanto, e se fosse agora? Não tenho dúvidas. Mas se fosse eu parvo o suficiente? Ou o racional de mais? O presente ainda me coloca mais questões do que o futuro.

Não nós, mas os leitores e eu: segredamos as coisas. O que farei? Não sei. O que ouvirei: uma forma querida. O que responderei: nada. O que penso agora: a estupidez do motivo que me levou a escrever isto. O que acho em termos matemáticos: Deveras improvável.

PS: Acho que o ser casamenteiro não se aplica a mim. Só o consigo ser para os outros. Mas o passado não o posso largar do nada. E ela é um marco indúbio que me fez abrir os olhos e pensar como poderão ser e o que poderei achar das pessoas que poderei vir a amar no futuro. Raios parta para os outros que me chamam tonto todos os dias. Mas eu é que sei da minha vida. Cá dentro, mesmo que o coração bata por estar atarefado, o cimento está forte. E acho que isso é bom!

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

A brincadeira a que se chama morte

Estava uma manhã de Sol. Era Outono. Uma sexta-feira. Ainda cedo, aquele rapaz sai de casa a pé e passa duas estradas perigosíssimas e nada lhe aconteceu. Rapidamente chega ao pé da escola dele. Aí, quando faz a curva no passeio para entrar pelo aberto àquela hora, ups... Olha para trás, porque ouve uma respiração ofegante. Mas não era nada. Ninguém nem nada de diferente ali estava. Apenas um largo campo com buracos fundos e ainda alguns camiões estacionados.

Ao pé do portão da escola, ouve-se um disparo. No instante seguinte, depois de o rapaz ter olhado para a direita, de forma a que pudesse perceber o que se estava a passar, sente algo a entrar no seu corpo e cai no chão. Ninguém ali passou até mais de meia hora depois. Quando a funcionária de um dos pisos da escola ali passa e vê aquele rapaz ali deitado no chão, quase que grita. Ele não tinha nada ao pé dele, nem mala, nem saco, nem carteira, nem tão pouco telemóvel. A senhora com vontade de ajudar o rapaz, já frio e de olhos fechados entra de rompante na escola e começa aos gritos. Liga para os bombeiros e pede que venham com a máxima rapidez.

Poucos minutos depois, começam as sineres a serem ouvidas, todas diferentes, uma ambulância do INEM, um carro da polícia e uma viatura que trazia um dos médicos que poderia ajudar os bombeiros na necessidade de algo mais técnico. A Polícia fecha a estrada. Os alunos apenas podiam circular por metade da escola. A entrada principal estava fechada, ninguém podia sair da escola. Apenas entrar, mas ninguém sabia disso. Alguns professores estacionam o carro do outro lado da escola e entram. Outros, mais curiosos aproximam-se o mais que podem do local e vêm ali um rapaz caído no chão, com pessoas de volta dele, a verificar se aquele corpo ainda vivia. E os minutos passavam... A campainha da entrada tocou e ele não apareceu às aulas. Estava ali deitado no chão, mas nenhum colega, nem professor da turma sabia o que se tinha passado.

A tal funcionária vai ter à sala onde o aluno ia ter aulas e pede para ter uma conversa com a professora de tal aula. Algo rotineiro para a turma e dessa forma ninguém estranhou. Quando a professora daquela hora volta para aula, e onde estava a resolver exercícios de revisão para o teste que seria brevemente, engole a saliva  que tinha na boca e diz que o tal rapaz que era aluno daquela turma tinha morrido.

O corpo dele já estava tapado com a protecção própria e já estava dentro da ambulância a caminho do hospital mais próximo. A turma ficou sem acreditar. A aula continuou apesar de ninguém ter cabeça. Viam-se alunos que sabiam a tabuada de cor a fazer 5 x 3 = 14. No intervalo foi a confirmação. Os burburinhos entre os professores chegaram a alguns alunos e os corredores comentavam aquela morte. A turma está igual, mais triste, mais calada, sem vontade de muito, mas ninguém chorava. Todos eles eram fortes.

O lugar dele continuava vazio. Claro que ele não voltava, estava morto. A aula das 10h serviu para que todos soubessem a situação. Nem todos aguentaram. Apesar de fortes, começaram a chorar. Os lenços que tal rapaz tinha deixado no armário da sala não chegavam. No entanto, as aulas tinham de continuar.

Chegaram a casa os alunos. Ainda o corpo estava a ser autopsiado no hospital. Uma bala certeira e mortífera. Alguns choravam, outros pediam aos pais para estarem junto deles.

A Directora da escola liga aos pais a dar as condolências e ainda algumas palavras de conforto.

Um dia depois o corpo fica em velório. Lembro-me de pessoas que ficaram ali quase o sábado inteiro. Impediam que aquele rapaz pudesse seguir para o crematório. E todos choravam ali.

Ninguém conseguia pensar de outra maneira, mas ele tinha deixado tanta coisa escrita para tantas pessoas que, era explícito que rapidamente encontrariam estabilidade e a falta dele não seria sentida.

Mas continuo a ver pessoas a chorar e já se passou um mês. No fundo, quando atirei aquela coisa nunca pensei deixar as pessoas assim. Carreguei no botão errado à hora errada. E ele ali ficou. E eles ali choraram. E o nós puf.... Foi-se!

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Depois da ida e da vinda...

Esta viagem foi... espectacular! Muitos perguntam o que eu fui lá fazer e eu respondo que fui andar de metro, porque na realidade o objectivo era esse.

Bem, só um maluco anda de metro em Madrid de propósito. Sim é esse o espírito. Para os não fanáticos por metropolitanos é tudo igual em todo o sítio do mundo. No entanto, para mim não. As cores são diferentes, as carruagens são diferentes, as vozes das estações são diferentes, a maneira como são anunciadas são diferentes. Mas o metro de Madrid é excelente! Um dos melhores no mundo. Como todos tem os seus pontos fracos, mas mesmo assim dá para ser classificado como um dos melhores!

Passei mais de 80% do tempo da visita, tirando claro os momentos em que estava no hotel, debaixo do chão. Analisei a maioria da rede do metro, tudo. Achei excelente. Todos podem pedir fotografias do metro que eu achei excelente, mas para vocês, que não gostam e não transpiram por transportes, será, mais um metro igual a tantos outros que existem no mundo.

A viagem não foi só isso. Lacrimejei algumas vezes. Mas percebi realmente o que sentia em relação a algumas pessoas amigas e colegas. E isso também me foi muito importante. Para mim foi estupendo mesmo, porque, as dúvidas que tinha, a distância tirou-as. Mas não tenho coragem para fazer o que deve ser feito. Apesar de já não ter dúvidas, estou de pé atrás. E sim acho que com o tempo, vou voltar a ter as dúvidas que tinha. Porque não sou corajoso o suficiente, mas sim pessimista e tento ser realista.

Lá está o que Jean-Paul Sartre dizia: " Ser-se livre não é fazendo aquilo que queremos, mas querer-se aquilo que se pode". Desta forma, que posso querer o tal aquilo e sentir-me ainda mais livre, mas não posso fazê-lo porque não posso cair num estado lastimável de novo!

E sim, mais uma vez a viagem foi excelente e sem ela, a viagem não tinha sido a mesma! Obrigado!